segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Coração de madeira




Cortei minha carne e saí do meu casulo
Estava a tanto tempo preso, morto, enclausurado em meu sepulcro
Separada de mim agora está a pelagem de chumbo
Sinto correr nas veias o sangue, sinto com peculiaridade o incumbo

O verde embriaga meus olhos, a beleza me trás dor
Minhas unhas são facas que raspam o bolor
Respiro. Respiro tão forte que minha face muda de cor
Enterro-me por completo e de olhos abertos assisto me recompor

Bela natureza você me revigora
Acredito que talvez em tempos de outrora
Fui largo e esplêndido como a aurora
Percorrendo teus vastos campos enquanto você me namora

Bela natureza você me fascina
Doce infância com cheiro de tangerina
Flor solitária que reside na parede da esquina
Em você tudo nasce, em você tudo termina

Minha garganta de tronco podre já não pode falar
Minhas pernas de bambu não querem caminhar
Minhas raízes neste lugar eu quero fincar
E quieto de olhos abertos, o verde contemplar

Autoria de Tiago André Vargas
Postado em 29.11.2010
Escrito não se sabe quando



quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Ego por ego





Caminhe insolente moça com o corpo esculpido pelo diabo, ande pelas travessas da glória insensata e efêmera enquanto a legião de equídeos te saúda, te aspira e com um desejo magnificamente humano te transforma em um império do ego, uma torre tão alta, forte e robusta que tornar-te-á inconcebível, despertando sempre a paixão forte e incontrolável de saltar pelo abismo, de morrer na tentativa.

Alimente-se destes infames, cresça ainda mais tua torre e encoste no céu, toda via quando o sol cair e a noite chegar, solitários ventos fortes podem surgir e tua frágil estrutura balançar. Mas você é forte, você é implacável, você crê que o mundo paira sobre tuas mãos errantes, queria eu dar-te um nome.

Queria eu poder saber quais palavras dizer para derrubar esta torre e você me olhar nos olhos, de frente e de mesma estatura, apenas para dizer-te a linda escória que és. Não diga nenhuma palavra. Você não tem culpa, você só aprendeu a respeitar este trato, minha criança levada de boca fechada sempre interessante, eu sei que é assim que você gosta, é minha ignobilidade que te encanta, de outra forma, aborrecida se afastaria por ser apenas mais uma pedra do teu castelo.


Autoria de Tiago André Vargas
Postado em 24.11.2010
Escrito não se sabe quando



segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Presente

Estavam em dúvida entre os nomes Anderson e Valter. Ficou Valter.

Quando pequeno sua mãe lhe deu um boneco de presente, mas Valter ignorou. Ao ser esquecida uma caneta perto de sua pequena mão ele esboçou alguns rabiscos.

Valter não parava de chorar certa noite em que seu pai estava sozinho em casa com ele. A tv foi posta no canal de desenhos, mas foi uma tentativa frustrada. Passando os canais, encontraram uma ruiva linda falando sobre arquitetura grega. Valter fez um silêncio assustador com seus olhos gigantes de bebê.

Os pais de Valter estavam em dúvida perante a escola que estudaria. Optaram pela escola de seu bairro.

Na escola de seu bairro, Valter apaixonou-se pela professora mais linda da escola. Ela era ruiva e lecionava educação artística. Valter queria sempre impressionar ela e para isso aprendeu a desenhar muito bem.

Aos 14 anos, Valter tinha muitos amigos. Em uma tarde qualquer, ligaram para ele o convidando para ver um filme. Valter disse que preferia andar de bicicleta.  Seus amigos aceitaram.

Enquanto andavam pelas ruas do centro da cidade de bicicleta, Valter corria velozmente e quase atingiu uma velha senhora despreocupada. Evitou a colisão mudando o seu trajeto rapidamente direcionando-se para uma rua cuja qual nunca passava.

Nesta rua que Valter não conhecia, havia uma loja de cd’s. Valter parou a bicicleta e olhando para a loja, largado no canto da vitrine, havia uma ilustração que chamou muito sua atenção. Era a capa do cd “The division Bell”.

No momento de escolher o curso da faculdade, Valter estava em dúvida, gostava de história, mas optou por arquitetura e urbanismo.





Estavam em dúvida entre os nomes Andressa e Valquíria. Ficou Valquíria.

Quando pequena sua mãe lhe deu uma boneca enorme, mas Valquíria não ficava muito com ela na mão. Valquíria preferia empilhar peças coloridas até formar uma grande torre e depois ver ela cair.

Certa noite Valquíria não parava de chorar. Sozinha em casa com seu pai, o mesmo tentou algumas canções de ninar sem sucesso. Imponente, com uma voz grossa e sinistra começou a cantar High Hopes. Valquíria fez um silêncio absoluto e depois cresceu lentamente um sorriso debochado em sua linda cara de joelho.

Com uma ótima proposta de emprego para sua mãe, a família de Valquíria se mudou para uma cidade próxima. Sem muitas referencias a mesma estudou em uma escola bem próxima naquele bairro.

Aos 13 anos, suas amigas lhe convidaram para ir ao centro da cidade, para verem algumas roupas. Como seu pai estava de aniversário naquele dia, resolveu ir junto para lhe comprar um presente.

Encontrou uma loja de cd’s ocasionalmente e resolveu entrar nela. Dentro da loja, pediu para a atendente quais cd’s do Creedence ela tinha. A atendente era nova na loja e tinha pouca prática com o manuseamento das mercadorias, deixando um cd cair na parte da frente da vitrine, mas a mesma não percebeu.

Valquiria saia da loja com seu cd embrulhado na mão e avistou um garoto fedido sobre uma bicicleta olhando compenetrado para a vitrine. Indiferente continuou o passeio com suas amigas.

Valquiria gostava de muitas coisas e estava em dúvida sobre seu curso da faculdade. Gostava de direito, tinha uma atração inexplicável por fisiologia e acabou optando por arquitetura e urbanismo.





Terminada mais uma aula, o professor míope fazia lentamente a chamada, atrapalhando-se com tantos nomes e linhas em sua planilha. Letra por letra os alunos saiam da sala de aula.

Valter aguardava a chamada de seu nome fazendo alguns rabiscos.

Valquiria olhava interessada para aquele garoto que desenhava tão rápido de cabeça baixa.

Valquíria se aproximou.

Valter percebeu.

- Essa não é a capa de um CD do Pink Floyd?

- Isso mesmo... Seu nome é?

- Valquíria. Prazer.

- Prazer Valter.

Ambos trocaram um sorriso de incontrolável interesse.

O velho professor juntou mais ar em seus pulmões e disse com um pouco de impaciência:

- Valquíria de Lucena!

- Desculpe professor, presente.

- Valter de Moraes?

- Presente!





Realmente, estas coisas incríveis que acontecem em nossa vida sem compreendermos sua magnitude, são um presente. 

Autoria de Tiago André Vargas
Postado em 22.11.2010
Escrito não se sabe quando


sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Da realidade e fantasia

Diga-me companheiro
Que mal existe em verdadeiro
Tornar-me um esquizofrênico
Se lúcido razão não vejo?

Eu caminho para algum lugar
Joelhos gastos de pensar
Rostos sem vida a passar
A exaustão de não tentar

De fato o mundo real
Não poderia ser mais banal
Você é especial
E morre tão igual

Viver este mundo, realidade
Se tornar um homem de ação
Abraça a racionalidade
Ignora a alma e o coração

Viver no outro mundo, pensamento
Se tornar um homem de imaginação
Você existe conforme o desejo
Mas vive apenas uma ilusão

Os dois são falhos, nenhum é perfeito
Perfeito é apenas o lamento
Em que tudo há defeito
E simplesmente nada pode ser feito

Autoria de Tiago André Vargas


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