quinta-feira, 17 de outubro de 2013

Sucedâneo primata















O osso calcâneo
Só olha para trás
Não há gerânios
Ou pelugem lilás
Existe a sucessão
Cinza sucção
Negra ilusão
Doce sanção
E o pri(mata)meiro tanto fez e faz
Ternura apenas nos olhos do bezerro
Criança sorrindo na paz do enterro
E o pri(mata)vilégio que aqui jaz

L

17.10.2013

Tiago André Vargas


domingo, 13 de outubro de 2013

Encontro marcado





Joguei meus sapatos para cima e eles incendiaram ao tocar a liberdade de um céu sem nuvens. Azul sempre foi a cor do amor, sentimento aparafusado pela calmaria da água com a destreza de um avô consertando um brinquedo querido.
Mas nem toda água é azul. Eu sei disso por querer sentir como ontem.
Algum ontem.
Pés entremeados na terra lamacenta, sujeira reciclável, dedos sujos rasgados por vidros limpos. É necessário caminhar. Cheguei à margem do rio da minha vida. Contemplei-o da mesma forma que havia feito outras vezes. – Vezes. Qualquer número multiplicado por zero é igual a zero. Eu desenho o círculo perfeito. – Os mesmos tocos podres sendo carregados pela água turva, a mesma ausência de peixes, deferência e piano, o mesmo espelho lúgubre que delatava um monstro em tímido aproximar. Eu espiava sabendo o que seria revelado. – Sou uma morte perfeita.
Olhei no outro lado do rio e vi você.
Sua pele leitosa como um exército de margaridas pós holocausto me deu nojo. Sorri como um lobo e lhe disse que havia todas as respostas para suas perguntas ainda não formuladas no leito do rio, permitindo que pequenos silvos por entre meus dentes afiados escapassem elucidei que ter as respostas antes das perguntas era como colocar o dedo antes de surgir a ferida. E todo toque é bom quando não há dor. Você sorriu. Dois sextos do meu ser cogitou benquerer você, mas, não somos aquilo que queremos ser.
Saltaste na água com a força que eu desejava, projetei meu corpo logo em seguida.
Abri meus olhos e vi a sujidade dançar em líquido palco turvo, braços e pernas sempre tão errantes buscando algo, em nosso caso, profundo, pois somos feitos de lodo e não vamos parar até tocar o fundo.
E no fundo estamos amor.
Tudo é sujo e você é branca.
Tudo é barro mas você encanta.
Tuas vestes efêmeras são como pétalas que com dois dedos se arranca. Te hipnotizo sem olhar, puxo teu cabelo para trás, mastigo teu ombro no fundo do rio da sua vida.
E a cada segundo respirar menos importa.
Se entregue amor, sei como você gosta.
Abra sua boca e beba dessa água turva enquanto dança em meus braços. Vire-se para gozar dentro da minha íris, muito prazer, durante toda sua vida lhe esperei.
Sou sua morte sem encontro marcado lhe forçando o prazer de um último viver.
E tudo a água irá levar.
Menos eu.
Saio do rio sem estar molhado. Lá me aguardam novos calçados. É preciso caminhar e novamente assim o faço.
Sem olhar para trás, sequer para mim.
Um dia, você.

Tiago André Vargas
12.10.2013


Pintura de Andrew Wyeth.

segunda-feira, 7 de outubro de 2013

final das ondas contas





No final das contas
Há o quebrar das ondas
Nada há mais

O ambicionado final feliz
Enxertado em vida plim plim
Prostrado, também a onda irá levar

No ponto mais profundo – logo triste – do oceano
Acaso empilham-se pratos porcelânicos lavados em pranto
No ponto mais profundo – menos triste – do oceano
Um dia meu pó abraçará algum nó
Seu

No início das contas
Há o quebrar das ondas
Nada há mais


Tiago André Vargas
07.10.2013


Imagem de InoaLa.

domingo, 6 de outubro de 2013

Resenha do Livro Mariposas no Útero - Evento Literatura Caxiense Recente




Resenha de Karina Catuzzo Rodrigues:



Sangue e amor


Uma faca. Um alvo. Um suspeito. Promessas, ciúmes e amores enlouquecedores. Um livro para fincar na cabeça. Um vício. Relato de muito suspense que marca a boa estréia de Tiago Vargas.


Mariposas no Útero é a obra de estréia do caxiense Tiago André Vargas. Um romance misterioso, aventureiro e emocionante. O envolvimento familiar, amor de pai para filho, paixões e loucuras fazem o leitor participar da história de forma intensa.

Já no começo da trama um assassinato misterioso faz com que o leitor fique imaginando quem poderia ter cometido a maldade “Com as mãos sobre o estômago o jovem caiu de joelhos e sua boca que antes irradiava aquele belo e jovial sorriso agora era berço de um pequeno filete de sangue…”

Vargas é minucioso, faz descrições detalhadas, e isso leva os leitores a se prenderem cada vez mais na historia. E o romance traz muitos personagens: Josh, Andréia, Débora, Mayara, Roberto, Afonso… Mariposas no Útero começa com um encanto por uma garçonete, passa por assassinatos, confusões, ameaças e quase “roemos” as unhas para descobrir qual o final deste enredo que hipnotiza.

O interessante é que, na leitura, o autor volta no tempo para entender a história dos personagens, da onde vieram, quem são, por que estão ali. No capítulo XV, por exemplo, Vargas interrompe o relato da vida de Josh e sua loucura por uma garçonete para contar as trajetórias de Afonso e Roberto, que também são personagens chave no desfecho do romance.

Mariposas no Útero pode ser considerado um livro de certa forma confuso, pois o enredo é misturado de propósito pelo autor. Assim, o leitor deve redobrar a atenção ao ler. “Fora queimado o plano divino, descrente o destino e restou apenas o acaso. E o acaso é um velho bêbado de revolver empunhado mirando nos teus rins, exigindo que uma música inexistente seja dançada.”.

Mariposas no Útero filtra a imaginação, encanta, amedronta. Usa um acontecimento do cotidiano, que pode acontecer com qualquer pessoa e desvenda mistérios… um leitor que vai a um bar e esbarra em uma garçonete e, no fim, descobre que ela é peça fundamental na sua vida. O suspense prende a atenção e, como se fosse um filme, carrega no suspense “Nenhum pintor mostra se quadro inacabado. Se você entende o processo, o resultado perde valor”.

Tiago André Vargas é natural de Caxias do Sul, do distrito de Vila Cristina. É autor do livro Mariposas no Útero, um romance que traz humor, banalidade e, não raras vezes, o amor. Foi premiado no concurso nacional Associação Nacional dos Escritores, ANE – 50 Anos, com o conto A Violinista e contemplado no 4º Prêmio Literário Sérgio Farina com o conto E assim se fez o mar.

Para Tiago, o importante não é poder escrever, e sim, querer escrever. É quando querer escrever não é uma escolha, é uma necessidade. É como amar alguém. Assim, as significativas aprendizagens acontecem somente durante a caminhada e toda escolha é certeira se feita com o coração.


Para o autor: “Todos os livros que eu li, pessoas que eu conheci, eu acredito que todo e nenhum detalhe da minha vida me colocaria um dia em frente de uma página em branco dizendo: Seja agora quem tu és. Desde então, eu tento ser.”.

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