Uma breve conversa
sobre movimento.
Sem gesticular,
trepidar ou comover os lábios.
Uma conversa sui generis, sólida e inexistente.
Três da manhã.
Seis olhos abertos.
Três lares distantes.
Zeras.
Sem som.
Culpa.
Muita culpa.
É preciso voltar logo
a dormir.
As três mulheres
detentoras de magnânimos úteros e reclusas emoções delineadas, visíveis apenas
aos lobos ou raça equivalente, abriram os seis olhos em um despertar forçado às
seis da manhã.
Seus corpos flácidos
sem tempo para o suor estático são lavados com desdém, subjugados pela
incredulidade que algum poeta seria capaz de uma quadra em lisonja.
Nenhuma cor dos olhos
daquelas três mulheres se repetiam, belo seria suas faces adjuntas entornadas
por moldura de madeira velha.
Mal acordaram.
Mal banharam.
Mal comeram.
Mal sabiam.
Já saíram.
Cada uma em seu
carro. Todas sozinhas. Com veículos de cores dessemelhantes as latarias e aos
olhos.
Cada uma dirigia
velozmente, a matéria ágil se deslocava indiferente às emoções que pulsavam em
cada esquina; os canivetes limpos nos bolsos de homens sujos, os ovos amarelos
libertos meticulosamente por uma joaninha, a mulher à janela de cigarro entre
dedos aguardando o fim dos dias.
Todas viravam o
retrovisor fitando parcialmente o próprio rosto, inconscientes do desejo da
imagem que ansiavam. Apenas olhavam, desconexas com si próprias, tal qual
produto em prateleira que será olhado com prévia certeza que não será levado.
Nestes momentos, os
sentimentos não permitem surpresas.
Quis este filho sem nome
e com vaga impressão de um sobrenome que estas três mulheres parassem ao mesmo
tempo em fronte a uma sinaleira.
Os três carros, as
três cores dos seus olhos, as três cores do semáforo, as três ânsias no contar
do tempo.
Todas olhando para
frente, concentradas no nada. Objetivando a partida, racionalizando a chegada
não questionada.
Um idoso, fatigado
pelas passadas de tantos anos e de olhos fechados, cego talvez, ousou tocar um
primeiro pé com cuidado na faixa de pedestre. Ele segurava uma corda cinza aparentemente
tão antiga quanto si próprio e na ponta desta, um vira-lata amarelo de
estranhos olhos verdes tal qual folhagem de aglaonema.
O homem caminhava
devagar.
Cada passo seu era
estudado.
Zeloso.
O cão jamais
espichava a corda. Caminhava em um trote interrupto, suas passadas condiziam as
do velho amigo, uma dança inventada pelo desgaste do tempo através da exaurida
corda que os unia.
Uma dança de verdade.
Uma rara dança real,
espontânea, sinceramente brutal e lenta, tão lenta e implacável como o escorrer
dos nossos sonhos.
Os seis olhos lhes
acompanharam de uma ponta à outra da calçada.
O tempo da travessia
foi exatamente a troca de cores do semáforo.
Quando o verde no céu
brilhou, mais claro e menos sincero que o par esverdeado no rosto do animal, nenhuma
daquelas mulheres sabia precisamente o que fazer. Para onde seguir. Por que
seguir. O que era seguir.
Dentro de cada cor de
cada semáforo existe um desejo latente de parar ou continuar. Geralmente de
continuar. Nem sempre é possível. Paciência é preciso, ou, estar no lugar
certo.
Alguma analogia sobre
a vida e a invenção do progresso.
Faltou algo nesta
conversa.
Um pedaço rançoso que
desrespeitosamente será pronunciado com a bravura de um pesar ingênuo:
Aonde.
Tiago André Vargas
Imagem de Alina Shamalova.
Eu viajo com seus textos/ poemas/ sentimentos.
ResponderExcluirParabéns mais uma vez!