domingo, 1 de setembro de 2013

Retrato de quem nunca existiu





Sou discrepância
Preciso calar para escutar quem sou
Sou deselegância
Por inconstância
E logo há amor
Se falo é para me convencer que feliz estou
Se sou
Pouco soou
Ressoou e agora sou
Não ajo desta maneira quando sou você
Fico à mercê
Um esgoto quebrado revelando meu futuro
As piores previsões
Não somente táteis maldições
Também os cadarços da temeridade amarrados por sua mão na madrugada
Para que triunfe em minha desídia
E diga que já sabia
Neve ou geada
Beijo ou mamada
Ovo ou gemada
Estou longe da sua cozinha
Longe da sua barriga
Das arestas vazias dos teus dentes de mendiga
Em fato
Me surpreenderia lhe ver viva
Mesmo se batesse na minha cara
Ou surgisse de madrugada no teto grudada
Escrava, porca e diabólica amada
Você é uma foto na parede pregada
Sem cores e moldura riscada
Apodrecendo em uma casa abandonada

Fotos de outro século
Fotos de outra geração com mesmas discrepâncias
No fim, todos viramos um retrato de alguém que nunca existiu
Outros antes
Depois
Para alguém
Ou outro
Novamente tempo e lugar
Não posso sorrir
Talvez já não tenha mais cores
Mesmo assim me corto
Uma tela não mais vazia
E ainda sem justificativa
É pintura
É mentira
Tanto mais morta enquanto viva
Creio que cria
Letargia
Registro de vida
Não é vida

E

Não há saída

Tiago André Vargas


Fotografia de Carolina.

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