Passagem
do conto “Qual o Mal de a Mina?”, do livro Fátima Fez os Pés para Mostrar na
Choperia (Editora Estação Liberdade, 1998), do autor Marcelo Mirisola:
(...)
Hoje
é a palavra pela palavra. A solidão da coisa feita. Ou a indisposição de
frequentar o casamento dos amigos. Eu lhe digo, embora não tenha nada a ver com
esta viadagem de dizer “porque eu sou um artista e coisa e tal”, eu lhe digo a
mesma coisa que eu disse para a armeniazinha do Bom Retiro, sabe, meu amor,
quem faz arte como eu serve a morte; morre várias vezes ao invés de viver uma
vidinha de armarinhos; daí vem a demagogia e a comparação que eu sempre faço
nesses casos: “que nem cachorro”, sabe? Sem frescuras do tipo “Bom dia, como
está?” Cheirando logo o cu da rapaziada. Se Michelangelo, para falar de um cara
que todo mundo conhece, vivesse hoje e pudesse escolher, cheirava o cu da
rapaziada e vice-versa. Au, au e estamos conversados. Depois ele iria cuidar de
Davi e de Moisés. Que, bem verdade, são exemplos latentes, primeiro Moisés e
depois Davi, da solidão da coisa feita.
(...)
Agora
é para você, meu amor.
Sou
capaz de matar por uma guimba manchada de batom. De ser um santo, quer dizer, o
que eu tenho vontade mesmo é de ser garçom. De verdade mesmo eu tenho vontade é
de cobri-la na porrada, de quebrar a sua cara e falar algumas coisas que você
não vai compreender. Também dar uma volta de pedalinho no Lago Lundoya, minha
branquela, e depois comprar uma maçã do amor para nós dois e mais um sorvete de
flocos para mim. Pegar na sua mão e dizer que amo você.
17.12.2015
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Fotografia de Jonatan Mattsson. |
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