sexta-feira, 14 de outubro de 2011

Diários, aspargos e fantasias sem afagos

No fim, aconteceria. Nasce a noite, cai o dia... De alguma forma, aconteceria.

Dueto em prosa, oratória compartilhada. Eu e você
O vinho massageava meu corpo, tua fala envergava minha mente
Se a fala findava nos teus olhos ficava e sentia-me contente
Errado, pecado e todo resto acompanhado. Sinto. Bem como sei que também sentes

Mas não haveria maneira de pedir-lhe um beijo
São os valores que levo de berço
O mal que te faria carregar este peso
Ou ainda simples ultrajado medo

Cortastes minha desatada rede de pensamentos  
Pediste licença se dirigindo ao banheiro
Algo tão natural quanto dobrar os joelhos
Não fosse o abandono das vestes, a nudez por inteiro

Não que lhe tenha visto desta forma
Apenas notei tuas roupas voarem pela porta
E antes que pudesse no teu corpo imaginar
Teu pequeno diário na estante a mim parecia gritar

Olhei para ele e te vi diante de mim
Você encadernada me esperando
Sem remorso, sem culpa, sem fim
O Desejo cuspindo no rosto do Entretanto

Corri meus dedos pelo diário, brinquei
Como faria com o primeiro botão da tua blusa
Senti a rigidez da tua capa, suei
Assim como seria com a tua carne dura

Com um gesto enérgico folhei, tua letra eu vi
Encantei-me com a precisão das tuas palavras
Desvendava-te nua diante de mim
Mas não afoitei tocá-la

Na distância de um dedo deitado te percorri
Pus meu olho bem perto da tua pele e parti
Via-te os rabiscos, o tracejado sublinhado
Via-te os pelos ouriçados desejando ser tocados

Esfreguei minha palma em ti
Cada curva digitálica te abraçava
O globo ocular transeunte, lendo
Meu coração disparado te concebendo

Livro devolvido sobre a mesa
Terminei de ler-te e já estavas em mim
De uma forma que jamais poderia ser desfeita
Difundido à tua essência abandonei-me por fim

Saíste nua do chuveiro de corpo sedento
Viste o diário aberto sobre a mesa
Entristeceu-se pela falta de minha presença
Repudio-se pelo remorso almejado que não cometera

Havia um bilhete atravessado no gargalo do copo:

“Enquanto te decidias se o pecado cometeria
O mais transgressor amor eu me permitia
Descobri-te de uma forma que não poderia
E aquilo que antes não passava de uma carnal fantasia
Acabou por se tornar minha ruína
Também me colocarei nu dentro de capas
Me entregarei aos teus olhos azuis onde nada escapa
Todo meu amor gravado em uma página que jamais será virada”

Aconteceria. Nasce a noite, cai o dia...

Autoria de Tiago André Vargas
Foto encontrada aqui.

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