quarta-feira, 30 de setembro de 2015

Primarvera



É primavera, eu não te amo. Chupa essa bagaça, arregaça e afaga a mágoa da marca aureolada que eu te dei. Cansei. Você pensa que é um pensamento em mim. O sol nasceu e você morreu, antes do fim, na última linha, um tropeço para a vitória, não, é tarde. É tarde. Não? É tarde. É na tarde que nasce a primavera, depois que o sol almoça e fica gordo, quando os ponteiros trepam em cima do número doze, tic-tac, o maior cuco da América Latina copulando de maneira subdesenvolvida, nas esquinas, quebramos o leite quando derramamos o copo: senado-verão, centrão, prestação que não deixa prestar atenção! Lá vem o trem. É inverno na Síria, sem gíria, se anima, o mundo tem sua periferia masss se visto com a bunda sentadita em uma cadeira da puta Cochinchina não há linha. A linha não existe, Manolo. Nem mesmo a estação! Nem da vera-verão, nem da prima-vera. A flor se abriu, há esperança. Não. É tarde. O trem vem de outra estação Estranha-Sensação do Brasil. Do outono eu não falo se não eu me abro, desabrocho quando murcho. É primavera, estou confuso. Alguém passa margarina em mim para eu sorrir. Olha! Um camelo! Tirem-no da minha frente, ou eu o fumo. Fumo o camelo que cheira a flor que abraça a primavera. Longe demais. Perto demais. Alguém passa uma linha para eu saber onde estou. Não. Fiquem onde estão! Nada pode se mover! Vejam! Todos estão respirando! É um milagre. Todos vivos! Com seus sentidos! Com suas guerras particulares que nada sabemos a respeito! Ainda assim compartilhamos o ar, sem nos conhecermos. Deveremos dar as mãos? Quem sabe uma ciranda? Aprendemos que falar a verdade trás consequência, e consequência é uma palavra de peso morto mosca morta, mentira trás esperteza, avarenta ascendência. Ele se deu bem. O mundo é dos espertos! Ésquilo gostava de morrer no outono. Isso é um assalto! Ninguém desabrocha! Passa, passa, a primavera, na atividade! Roubaram os gregos. Ésquilo espera ser contemplado no consórcio. Se não existisse flor, não existiria primavera. Se não existisse a Vera Fischer, estaria tudo bem. As abelhas fazem poemas para a primavera, com suas patas rechonchudas, polainas de pólen, tão sinceras e sóbrias, bota um pouco de mel no chá, meu filho, alivia a enxaqueca, crescer é um problema, crescer é ser vespa, amar é hornet. Adulto estação, adulto trem. Só amanhã de manhã. Seja bem-vinda, primavera. Contamos com você para matar agosto, para nos livrar do desgosto, para mostrarmos nosso corpo e assim, como laranjas pétalas chovendo em setembro, quem sabe nos reconhecermos. É primavera. Eu não te amo. Mesmo que amasse. Sempre foi tarde.


Tiago André Vargas
28.09.2015


Fotografia de Kurniadi Widodo.


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