sábado, 14 de janeiro de 2012

Vestido de terça

Fui pro Sri Lanka sem saber escrever o nome deste país. Voltei com safiras largas e bem alinhadas apenas para te ouvir dizer que nada combinava com aquele tom de azul. Esqueceu que minha cor preferida é vermelha?
Hoje existem aqueles programas de milhagem, voltei. Retornei. Vermelho é tão vulgar, parece batom de puta. Joguei o rubi no chão e assisti ele quicar 5 vezes até meu gato mordê-lo e levá-lo para longe... Quem sabe dar de presente para sua gata.
Você disse que não sabia e começou a chorar.
Talvez fosse cansaço de caminhar, mas quando te peguei no colo impaciente reclamou que estava gorda ordenando que ao chão fosse devolvida.
Talvez fosse o mormaço, mas quando te assoprei alado em folhas de bananeira tudo que fez foi espirrar, de forma úmida que gera constrangimento.
Talvez fosse a surdez, contudo nem o pássaro alaranjado capturado sobre pé torto de goiabeira, aquele capaz de assoviar marooned com seu pequeno e frágil peito, nem mesmo este fora capaz de atentar-te. O que você queria ouvir todas as tardes mortas escorada sobre a janela enquanto olhava para o magnífico imponente completo nada?
Talvez fosse a falta de tato, contato, palpação. Mas quando meu corpo te envolvia em plenitude e nem tuas unhas escapavam do meu toque, embrulhada como um presente de natal pela minha derme fatigada, por que acuada esvanecia?
Talvez fosse o cansaço de respirar, mas quando eu te perfurei simetricamente o que fez além de escorrer para os lados? Pela fresta da porta, pelo ralo... Eu só queria te deixar feliz. Mas isso não te deixou feliz.
Você estava na lavanderia. Vendo os panos coloridos girarem, caindo um sobreposto ao outro. Espuma, água, gravidade. Tudo a girar, sempre.
Então você parou de chorar.
Não era a mim, não era o meu esforço inescrutável.
Havia um traje intruso dentro daquela máquina enferrujada. Um vestido que te trouxe de volta a vida.
Acidentalmente, tudo que você queria era voltar a ter quinze anos numa terça-feira... Numa infinita terça-feira que se acorda com barulho de mãe dizendo que era para colocar aquele vestido. Aquele simples, surrado, amarrotado... Aquele vestido que nunca deveria ser usado com presença de visitas. Nunca usado em passíveis julgamentos.
O vestido usado apenas quando se podia ser quem se era.
O vestido usado para poder ser quem se era.

Mas, ele não caberia mais em você. Caberia?
Autoria de Tiago André Vargas
Foto encontrada aqui.

Um comentário:

  1. Sabe a Felicidade cabe quando a gente quer que ela caiba, na verdade a gente acaba se tornando o maior inimigo dela, a gente escolhe se tudo continua "girando", ou se a gente quebra este eterno processo de "girar", tem que ter coragem.

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