As
árvores voavam rápidas através da minha visão estática.
Talvez
passassem por mim, ou, através de mim.
Não
poderia fazer isso por muito tempo de qualquer forma.
Enjoo.
O
ônibus parou, bem como faria outras vezes para rasgar minha rede de pensamentos
recolocando-me em meu devido lugar. No ônibus.
Ela
entrou.
Não
foi simples assim.
O
ar se eximiu um pouco, a gravidade desprendeu-se um pouco, a calota polar saiu
da roda, o mundo saiu da rota, estávamos em queda livre no espaço azul escuro.
Não. Eu estava.
Ela
carregava consigo uma borboleta tatuada no colo.
Era
mágico, como ver pela primeira vez uma girafa. Eu sorri o mínimo que pude para
não chorar.
Ela
escolheu seu lugar a esmo, não era isso que os olhos castanhos pareciam procurar.
Mas algo procuravam.
Sentou-se
dois bancos a minha frente na coluna oposta e meu olhar diagonal pode
contemplar metade do seu rosto, o cabelo caía-lhe sobre a face suavemente antes
dela enfiar o indicador por debaixo empurrando-os para trás da orelha.
Pequena
orelha.
Pequeno
brinco.
Pequena
borboleta.
Aquela
tatuagem parecia querer me gritar algo. Correr pelo céu, bater asas, ser livre.
Ser leve. Ser belo. Ser elo para a dor. A lagarta, o casulo e somente depois a
brisa leve acariciando aqueles que a podem enxergar.
Será
que toda mulher que imputa uma borboleta abaixo da pele busca liberdade?
Cuidado?
Que
alguém crie flores para seu deleite matutino nos quentes dias de março?
Ou
será que é apenas uma questão de se transformar em outra coisa? Que coisa?
Qualquer coisa, ora. Na impossibilidade de saber quem se és como saber quem virás
a ser. Transforme.
O
ônibus parou novamente relembrando-me do ônibus.
Ela
se ergueu.
Recém
tinha entrado e estava se encaminhando para descer.
Pude
ver sua tatuagem novamente de relance enquanto morria alguns meses.
Será
que ela tinha pegado o ônibus errado? Será que seus olhos castanhos encontraram
algo? Uma resposta, talvez.
O
ônibus arrancou. Nutrido do olhar mais compenetrado aproximei-me da janela
fazendo com que minha respiração embaçasse-a. Me afastei um pouco.
Ela.
Colocou
a mochila sobre os ombros agudos.
Olhei
para a borboleta amarela seguida de sua face.
Os
olhos castanhos olhavam para mim.
Me
encontraram.
Nada
mais.
Depois
as árvores voltaram, velozes, indiferentes ao meu desejo.
Mas
eu não poderia fazer isso por muito tempo.
O
ônibus parou.
De
vez.
Autoria de Tiago André Vargas
Fotografia de Celeste.
Fantástico. poético. Um quadro e uma música. Acaricia os sentidos, só de viver o momento em que imaginamos o instantes descritos no texto. Muito bonito.
ResponderExcluirAnna, muito bom ler a sua mensagem, de coração. Volte sempre.
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