sábado, 26 de maio de 2012

Carona


Não que ele deixasse o cabelo crescer
Apenas não mais impedia
Não que ele houvesse desistido da vida
Precisava abandonar-se para ser

E ser, parecia ser a única saída
Que no fim, se sabia
Tratava-se de outra entrada
Findaram-se as portas
Secaram-se as mágoas
O polegar ereto na estrada

E a estrada, parecia ser a única saída

Um caminhão azul pintando o céu de negro
Fumaça mais linda nunca foi vista
Parou e apontou para a caçamba
Fundiu os olhos íntegros do motorista
Com dois movimentos entrou na carroceria

E ali, estava a vida

Entre pedaços de lenha quase podres
Que aqueceriam uma menina com luvas de lã
Lambido por cachorro manso que nunca passou fome
E o vento vaidoso perfumado por maçãs

A fumaça negra subia
Parecia estragar algo inteligível
Porém nome não era posto
Inocência
Os dedos gastos
Um espiral negro se desfazendo
E no fim apenas o cabelo comprido
Dançando no vento
Em uma carona sem destino traçando o pensamento
Era fim de tarde, olhos fechados, cabelos e vento
Isso bastava

Bastaria?
Autoria de Tiago André Vargas
Fotografia de Raluca.

Um comentário:

  1. Que lindo, Tiago!
    É possível visualizar a cena e senti-la de modo perfeito.
    Um texto cinematográfico!
    Abraço.

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